16 de jan. de 2010

cachorro velho, gata selvagem



 

Cachorro Velho, de arrepiado pelo cinzento,
De focinho erguido, farejando o vento,
Que traz notícias do inverno,
Que logo vai chegar,
Com força, frio, violento...
Gata Selvagem, de pelo avermelhado,
Nas bordas do deserto, arrepiada pelo mesmo vento, frio, lembra-se:
"Vou ter que suportar o relento!..."
Cachorro Velho, autodesaparecido, na paisagem do deserto,
E, por autopunição, quer ser solitário, quer ver ninguém conhecido,
Nem de longe, muito menos por perto!...
Cachorro Velho, de pêlo embranquecido, não está alquebrado -
Quer ser esquecido!...
Não quer ser lembrado!...
Sua emoção, está aparente no seu pêlo,
Que, por sua própria iniciativa, se arrepia,
Gritam, a ecoar no deserto, lancinante uivo, agudo apelo!...
Fez a escolha errada -
Solidão!
Não é para ele, Velho Cão!...
Nem de longe imagina, que logo,
Logo mais cedo do que pensa,
Acontecerão coisas, fatos
Que lhe cobrirão de ânsias, de medo!...
Cachorro Velho, Gata Selvagem,
Que passa ao largo do rio seco, na margem...
No momento está em busca, procurando abrigo
Para o desértico frio que aos poucos vai chegando,
Esfriando,
Congelando...
Na coincidência, preparada pela vida,
Descobrem ao mesmo tempo,
Cachorro Velho, Gata Selvagem,
Numa caverna, quente e adequado abrigo!...
Mas, antinatural seria a coexistência,
Pois que, um do outro, é arquiinimigo!...
Cachorro Velho, Gata Selvagem,
Cachorro Velho, com pêlo de branco, tisnado,
Assenta-se, quieto, ansioso, arfante,
A olhar fixamente, desconfiado,

Para Gata Selvagem, de avermelhada pelagem,
Que se confunde com o matiz da paisagem...
Ela, Gata Selvagem, também se aquieta,
Mantém - se alerta, esperta, em estado geral de alerta!...
É o que manda o seu instinto,
É a autopreservação que comanda!...
Ali está, bem próximo à gruta, seu velho inimigo,
Cachorro Velho cinzento, com pêlos arrepiados pelo frio do vento...
"Não porta belicoso espírito!..."
É o que pressente, é o que diz seu instinto,
Mas que também aconselha:
"É necessário abrigo!..."
"É necessária a gruta!..."
"É necessário o inimigo!..."
"Inútil a luta!..."
Não vacila, não titubeia, não tem medo
Tem muito mais que coragem - tomada de espírito solidário,
Porém, se mantendo em cautelosa, defensiva, suficiente distância,
Aguarda, com olhar de interrogação, para o Cachorro Velho, pronta para reação!
Cachorro Velho, Gata Selvagem,
Ante o frio que se aproxima mais e mais rápido, sem alarde,
Que envolverá, fatalmente, os dois,
Não deixa tempo para adversários,
"Isto, veremos depois! Agora, somos só nos dois!..."
Diz Cachorro Velho,
Concorda Gata Selvagem...
É prudente, mais que urgente, que se abriguem, que se aqueçam,
Agora, neste momento, imediatamente!...
Cachorro Velho, Gata selvagem,
Sem mais instintivamente pensar,
Se atiram à gruta, sem disputa, aquecida,
Ela, pela natural guerra esquecida, agradecida!...
Ele, com a solidariedade, comovido
Também pela presente, tão estranha situação,
Da inesperada, inusitada, quente amizade...
Também se aconchega, solidário,
Agradecido, solitário...
Cachorro Velho, Gata Selvagem,
Esquecem da natural questão
O que fala mais alto, é o vento, lá fora, louco varrido, enfurecido...
Velho Cachorro, Selvagem Gata,
Ele, de acordo com tudo, ainda está interrogativo,
Quieto, mudo;
Ela, trêmula, medo, frio...
Mas, de qualquer maneira, de qualquer forma, grata!...
Percebe, no Velho Cachorro, o ponto de interrogação
Passa o tempo; o tempo passa,
E lá fora, o inverno a deitar desgraça!
Mas há que se aquecer mais, há que se aproximar mais,
É o que cada um pensa;
E, aos poucos, de maneira cautelosa,
Com movimentação lenta, tensa,
Aconchegam-se, aquecem-se, agradecem-se...
Na escuridão da caverna, dos seus instintos, esquecem-se...
Agora se cuidam, se protegem!...
Ele conta, e ela ouve
Histórias de longe,
Derrotas,
Empates,
Embates,
Desastres,
Vitórias...
Gata Selvagem pensa:
"Quem sabe até aprendo mais, para a vida que me espera!?..."
É o que fica na sua interior atmosfera!...
Cachorro Velho, Gata Selvagem,
E passa o tempo temporal,
E antes, nesta estranha convivência, nesta mútua conivência,
Se dão conta, tomam por ciência - são, eram e sempre serão amigos;
Todas as guerras,
Os gritos,
Os conflitos,
Sabem agora, eram finitos!...
Era questão de recíproca paciência!...
Cachorro Velho, Gata Selvagem,
Ex-adversários naturais, ignorando seus tolos lados materiais,
Idades carnais, convivem, no fundo da gruta, juntos,
Na outonal espera da primavera,
Que logo virá...
E, no interior do aquecido abrigo,
Cachorro Velho passa a língua em dentes ainda afiados,
Pensando, com certa afeição por Gata Selvagem,
Que está ao seu lado:
"Quanto tempo perdido, em inúteis embates passados!...
Me pergunto:
"Qual a Razão!?..."
Em seus velhos olhos cansados, começa molhar estranha emoção!
"Meu Criador!
Por favor, me responda, como puderes, de alguma forma
O que acontece agora, nesta caverna,
É contra alguma pré-estabelecida norma!?...
Então, que sentimento é este,
Que toma forma, que transtorna, me transforma,
Da Gata Selvagem, de avermelhada pelagem,
Amigo, protetor!?...
É ordem superior, inconteste, alguma espécie de prova, algum teste !?..."
E mantém os olhos abertos, cada qual, uma lanterna,
A observar, cuidar, proteger, aquela criatura macia, tão terna,
Gata Selvagem, de vermelho pêlo...
"Não posso dormir, não devo
Tenho medo - corro risco de qualquer momento,
Este precioso estranho envolvimento,
Perdê-lo!..."
Mantém-se alerta, Cachorro Velho;
Dorme tranqüila, Gata Selvagem!...
E, quando de lá saírem, já não se saberá:
"Quem é Cachorro Velho!?..."
"Quem é Gata Selvagem!?..."
Mudaram natural comportamento...
No obscuro isolamento, souberam, aos poucos, se aceitar...
Ele, Cachorro Velho,
Ela, Gata Selvagem,
Souberam do frio, se proteger,
Em mútuo aquecimento, sobreviver!...
Tinham um do outro, natural calor para se aquecer,
Do inverno que veio e se foi...
Se questionam, se perguntam, se perturbam
"Como pode ter acontecido!?..."
Cachorro Velho, Gata Selvagem,
Diferente comportamento, diferente linhagem, diferente espécie,
Semelhante linguagem!...
Mas para que tentar explicar o que parece, totalmente inexplicável!?...
Nada fora do perfeito!...Nada fora de outro natural!...
Ele, Cachorro Velho,
Ela, Gata Selvagem!...
Agora, trazem no peito, renovada perspectiva,
Nova oração!...
E, quando saírem, ao primeiro alumiar, da manhã que se anuncia,
Farão de suas vidas, que julgavam distantes,
Paralelas, em demonstração de enorme coragem!...
"Quem é Cachorro Velho, de longa viagem!?..."
"Quem é Gata Selvagem, de vermelha pelagem!?..."

por Paulo Artur Rodrigues


13 de jan. de 2010

palavras apenas

Amo o sol, sua cor, seu brilho e intensidade. Mas, definitivamente, São Paulo não é uma cidade que combina com o sol do verão, diferente do sol acolhedor do inverno. Sol de verão combina com o mar e o sol de inverno, nas montanhas, em dias de frio..... ahhh o sol que aquece! Não tem coisa melhor...O calor e o sol, misturados com alguns sentimentos não me fizeram bem hoje. A impaciência crescia latente, misturando certo enjoô e ira na minha mente. Fiquei pensando: porque somos tolhidos quando desejamos falar o que pensamos e sentimos? Por que temos sempre que pensar um milhão de vezes antes de dizer o que se passa no coração? Um ato corajoso este. Como se faz isso? Ter que ponderar o que falar. Sensato. Queria gritar... Um pouco de insanidade às vezes cai bem! Mas sou péssima pra essas coisas e o que foge da sinceridade sempre me pareceu hipócrita e distante. E, num ato impulsivo, pode-se magoar, sem intenção, claro, mas, acontece. Deixamos sempre rastros e vestígios nas relações. Nunca tive problemas em pedir perdão por "ter pego pesado", esse tipo de orgulho não me fere e se alguém tem que falar algo pra mim, prefiro logo o pesado mesmo, desmistifica logo, não suporto meias palavras e o subjetivo não me agrada. Sim, sim - Não, não. Nada de complicação. Parece radical? Me parece real. Hoje eu queria falar muitas coisas: coisas boas, bonitas e até pesadas... mas, esse sol pesa na minha cabeça. Vou esperá-lo ir embora, vou pesar as coisas pra falar e espero terminar a noite só com palavras boas e bonitas e, quem sabe, o pesado vira poesia.





12 de jan. de 2010

happy new year




Talvez
Talvez não ser,
é ser sem que tu sejas,
sem que vás cortando
o meio dia com uma
flor azul,
sem que caminhes mais tarde
pela névoa e pelos tijolos,
sem essa luz que levas na mão
que, talvez, outros não verão dourada,
que talvez ninguém
soube que crescia
como a origem vermelha da rosa,
sem que sejas, enfim,
sem que viesses brusca, incitante
conhecer a minha vida,
rajada de roseira,
trigo do vento, 

E desde então, sou porque tu és
E desde então és
sou e somos...
E por amor
Serei... Serás...Seremos...
 

Pablo Neruda




New Year , New York




 feliz!!