27 de jul. de 2014

Não Me Afastar De Ti....





Disseste tudo ao dizer:

Quando a ausência de mim
Fizer presença em meu ser,
Visitarei a mim mesmo,
Para não me afastar de você.

Quando o peso do dever

Em mim soterrar a alma
Entre os escombros da vida,
Quero flutuar qual pluma
Na leve brisa da calma.

Quando o dizer tiver o poder

De revelar o que não quero,
Paro a pluma, guardo a voz,
Me rebelo no silêncio
Para me manter sincero.

Antes da noção do certo

Se revelar um engano,
Saio do cotidiano:
Adentro em outras rotinas,
Noutros mares vou pescar.

Não quero porto seguro,

Só âncora, vela e mar.
Âncora para ser meu porto,
Vela para me levar,
Mar para, no litoral,
As minhas ondas quebrar.


6 de jul. de 2014



 Art by Loui Jover
A UM TI QUE EU INVENTEI
Pensar em ti é coisa delicada.
É um diluir de tinta espessa e farta
e o passá-la em finíssima aguada
com um pincel de marta.

Um pesar grãos de nada em mínima balança,
um armar de arames cauteloso e atento,
um proteger a chama contra o vento,
pentear cabelinhos de criança.

Um desembaraçar de linhas de costura,
um correr sobre lã que ninguém saiba e oiça,
um planar de gaivota como um lábio a sorrir.

Penso em ti com tamanha ternura
como se fosses vidro ou película de loiça
que apenas com o pensar te pudesses partir.

ANTONIO GEDEÃO 
In Teatro Do Mundo, 1958